Acerto de contas.
John C. Reilly e Jodie Foster, Christoph Waltz e Kate Winslet, da elegância à
barbárie
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Orlando Margarido, CartaCapital
Deus da carnificina
Roman Polanski
“Pode ser variável o tom com que cada
versão, seja na tela, seja no palco, se lança sobre o impactante texto de
Yasmina Reza, Carnage no original. Mas sempre estará lá intacto o cinismo
contemporâneo que se reveste de falsa civilidade quando dois casais se
encontram para acertar as contas de uma diabrura envolvendo seus filhos. No ano
passado, uma montagem teatral comandada por Emilio de Mello lançou mão da
herança chanchadeira para abusar do humor sem esquecer a crítica. Na
preferência do diretor Roman Polanski, no entanto, o mesmo título Deus da
Carnificina presta-se a uma compreensão mais sombria e rigorosa, ainda que o
riso compareça para nos causar constrangimento.
O filme em cartaz trabalha assumidamente
com as vantagens que o cinema detém sobre o teatro, como a agilidade da câmera
a confrontar os contendores e a rapidez do corte que aumenta a tensão. Mas
Polanski faz suas escolhas pessoais, como mostrar o incidente que dá origem ao
conflito logo no início, impondo ao espectador a menor importância deste do que
ao desenrolar. Assim, vemos os dois meninos numa briga no parque em que um
deles golpeia o outro com um pedaço de pau. O opositor ferido tem uma lesão nos
dentes. Os pais do garoto agressor (Christopher Waltz e Kate Winslet) visitam
então os pais da vítima (John C. Reilly e Jodie Foster) para discutir uma forma de compensação. No início elegante, a
reunião descamba à barbárie com direito a insultos, e marca da guerra completa,
uma pulsão escatológica. Acrescente-se à virulência do texto uma irônica
condição de Polanski à época, quando dirigiu o filme em prisão domiciliar por
meio de ordens ao produtor.”
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