Herondes Cézar, Revista Bula
"Em 2010, o crítico de cinema Roger Ebert, que morreu em 2013,
divulgou uma lista de 100 grandes momentos do cinema que agradou em
cheio aos cinéfilos. Embora ele não os tenha numerado, pois não é um
ranking, acrescentamos os números para facilitar o trabalho de quem
quiser confrontar as informações com o que mostram os filmes.
Considerado um dos mais influentes críticos americanos, Ebert era
dotado de admirável capacidade de observação. Suas escolhas vão do mais
espetaculoso, a corrida de bigas em “Ben-Hur”, ao detalhe mais sutil, a
sombra da garrafa escondida em “Farrapo Humano”. Em muitos casos são
minúcias que escapam à percepção de espectadores distraídos.
Ebert registrou suas observações puxando pela memória, ensejando
diferenças entre o que escreveu e o que de fato ocorre nos filmes
relativos aos momentos número 21, 33, 45, 46, 79, 83 e 88. Nós optamos
por adequar o conteúdo destes ao que se vê ou se ouve nos filmes.
Em algumas situações, sentimos a necessidade de inserir explicações
entre colchetes, para facilitar a compreensão dos leitores; em outras,
acrescentamos o título do filme a que o texto se refere. Também
completamos os nomes de vários diretores e atores.
Agora, duas ou três coisas sobre a tradução. A nosso ver, o tradutor
deve preocupar-se mais em reproduzir a ideia do que o sentido de cada
palavra. Mas, onde foi possível, esforçamo-nos inclusive para manter a
estrutura da frase original.
Nos casos que envolvem diálogo, mais cuidado ainda se requer. Na
legendação de filmes, o tradutor tem mais liberdade porque, em tese, o
contexto lhe facilita as coisas. Além disso, ele precisa economizar
vocabulário para dar ao espectador tempo de ler tudo antes que entre a
legenda seguinte. (Nada que justifique, porém, os equívocos que
espectadores mais exigentes percebem.)
Na ausência da imagem, como aqui, é impreterível que se tente
exprimir o máximo de conteúdo, mesmo sabendo que é impossível traduzir
todas as nuances. Perfeição não existe, evidentemente, mas perseverar em
busca da excelência é fundamental para quem lida com cultura.
Após conhecer as argutas observações de Roger Ebert, tomara o leitor
se sinta apto a fazer sua própria lista de grandes momentos do cinema.
A lista:
1 — Clark Gable em “E o Vento Levou”: “Francamente, querida, eu não ligo a mínima”. |
2 — Buster Keaton de pé, tranquilo, enquanto a parede da casa cai
sobre ele; é salvo por estar posicionado exatamente no vão da janela [em
“Marinheiro de Encomenda” ou “Capitão Bill Jr.”]. |
3 — Charlie Chaplin sendo reconhecido pela moça cega, em “Luzes da Cidade”. |
4 — O computador Hal 9000 fazendo leitura labial, em “2001: Uma Odisseia no Espaço”. |
5 — A Marselhesa cantada em “Casablanca”. |
6 — Branca de Neve beijando Dunga na cabeça [em “Branca de Neve e os Sete Anões”]. |
7 — John Wayne pondo a rédea na boca em “Bravura Indômita” e galopando no prado com uma arma em cada mão. |
8 — James Stewart em “Um Corpo Que Cai”, aproximando-se de Kim
Novak, que vem do outro lado do quarto, e dando-se conta que ela
personifica todas as suas obsessões — melhor do que ele sabe. |
9 — A experiência das origens do cinema provando que, na corrida, os cavalos ficam às vezes com as quatro patas no ar. |
10 — Gene Kelly cantando na chuva. |
11 — Samuel L. Jackson e John Travolta discutindo sobre como dizem
“quarteirão” [sanduíche do McDonald’s] na França, em “Pulp Fiction —
Tempo de Violência”. |
12 — A lua recebendo no olho o cartucho disparado pelo canhão, em “Viagem à Lua”, de George Méliès. |
13 — Pauline em perigo, amarrada aos trilhos da estrada de ferro [em “Minha Vida, Meus Amores”]. |
14 — O garoto correndo alegremente ao encontro do pai que regressa, em “Sounder — Lágrimas de Esperança”. |
15 — Harold Lloyd pendurado no mostrador do relógio em “O Homem Mosca”. |
16 — Orson Welles sorrindo enigmaticamente no portal, em “O Terceiro Homem”. |
17 — O anjo olhando Berlim do alto com tristeza, em “Asas do Desejo”, de Wim Wenders. |
18 — O filme de Zapruder mostrando o assassinato de Kennedy: um momento congelado no tempo repetidamente. |
19 — Um africano saudoso de casa, dizendo tristemente a uma
prostituta que o que realmente quer não é sexo, mas cuscuz, em “O Medo
Devora a Alma”, de Rainer Werner Fassbinder. |
20 — O Coiote suspenso no ar [no desenho animado do Papa-Léguas]. |
21 — Zero Mostel lançando um copo d’água no histérico Gene Wilder,
em “Primavera para Hitler”, de Mel Brooks, e Wilder gritando: “Estou
histérico! Estou molhado!” |
22 — Um velho sozinho em casa, tendo de lidar com a morte da mulher e
a indiferença dos filhos, em “Era Uma Vez em Tóquio”, de Yasujiro Ozu. |
23 — “Fumando”. Resposta de Robert Mitchum, mostrando o cigarro,
quando Kirk Douglas lhe oferece um cigarro em “Fuga do Passado”. |
24 — Marcello Mastroianni e Anika Ekberg dentro da fonte em “A Doce Vida”. |
25 — O momento em “Céu e Inferno”, de Akira Kurosawa, quando o
milionário descobre que não é seu filho que foi sequestrado, mas o filho
do seu motorista — e os olhares dos dois pais se encontram. |
26 — A visão distante de pessoas surgindo no horizonte no final de “A Lista de Schindler”. |
27 — R2D2 e C3PO em “Guerra nas Estrelas”. |
28 — E.T. e o amigo passando de bicicleta na frente da lua. |
29 — Marlon Brando gritando “Stella!” em “Uma Rua Chamada Pecado”. |
30 — Hannibal Lecter sorrindo para Clarice em “O Silêncio dos Inocentes”. |
31 — “Um momento! Um momento! Vocês ainda não ouviram nada!” As
primeiras palavras ouvidas no primeiro filme falado,” O Cantor de Jazz”,
ditas por Al Jolson. |
32 — Jack Nicholson tentando pedir um sanduíche de frango em “Cada um Vive como Quer”. |
33 — “Ninguém é perfeito.” Última fala de Joe E. Brown em “Quanto
Mais Quente Melhor”, justificando para Jack Lemmon que casará com ele,
mesmo ele tendo dito que é homem. |
34 — “Rosebud.” [Palavra dita por Charles Foster Kane ao morrer, em “Cidadão Kane”.] |
35 — A divertida caçada em “A Regra do Jogo”, de Jean Renoir. |
36 — O olhar assombrado de Antoine Doinel, herói autobiográfico de
François Truffaut, na imagem congelada no final de “Os Incompreendidos”. |
37 — Jean-Paul Belmondo com o cigarro enfiado na boca insolentemente em “Acossado”, de Jean-Luc Godard. |
38 — A fundição do grande sino de ferro em “Andrei Rublev”, de Andrei Tarkovsky. |
39 — “O que vocês fizeram nos olhos dele?” Mia Farrow em “O Bebê de Rosemary”. |
40 — Moisés separando as águas do Mar Vermelho em “Os Dez Mandamentos”. |
41 — O velho encontrado morto no balanço do parque, sua missão cumprida, no final de “Viver”, de Akira Kurosawa. |
42 — O olhar assombrado da atriz Maria Falconetti em “O Martírio de Joana d’Arc”, de Carl Dreyer. |
43 — As crianças olhando o trem passar em “A Canção da Estrada”, de Satyajit Ray. |
44 — O carrinho de bebê solto na escadaria em “O Encouraçado Potemkin”, de Sergei Eisenstein. |
45 — “Tá falando comigo?” Robert De Niro em “Taxi Driver — Motorista de Táxi”. |
46 — “Meu pai fez uma oferta que ele não podia recusar.” Al Pacino em “O Poderoso Chefão”. |
47 — O misterioso cadáver nas fotografias em “Depois Daquele Beijo”, de Michelangelo Antonioni. |
48 — “Uma palavra, Benjamin: plásticos.” De “A Primeira Noite de um Homem”. |
49 — Um homem morrendo no deserto em “Ouro e Maldição”, de Erich von Stroheim. |
50 — Eva Marie Saint agarrada à mão de Cary Grant no monte Rushmore, em “Intriga Internacional”. |
51 — Fred Astaire e Ginger Rogers dançando. |
52 — “Não existe cláusula de sanidade mental!” Chico para Groucho em “Uma Noite na Ópera”. |
53 — “Chamam-me Senhor Tibbs!” Sidney Poitier em “No Calor da Noite”, de Norman Jewison. |
54 — A tristeza dos amantes separados em “Atalante”, de Jean Vigo. |
55 — A vastidão do deserto e, em seguida, as minúsculas figuras surgindo, em “Lawrence da Arábia”. |
56 — Jack Nicholson na garupa da motocicleta, com um capacete de futebol americano, em “Sem Destino”. |
57 — A coreografia geométrica das garotas de Busby Berkeley. |
58 — O pavão abrindo a cauda na neve, em “Amarcord”, de Federico Fellini. |
59 — Robert Mitchum em “O Mensageiro do Diabo”, com AMOR tatuado nos dedos de uma mão e ÓDIO, nos da outra. |
60 — Joan Baez cantando “Joe Hill” em “Woodstock — 3 Dias de Paz, Amor e Música”. |
61 — A transformação de Robert De Niro de esbelto boxeador a barrigudo dono de boate, em “Touro Indomável”. |
62 — Bette Davis: “Apertem os cintos. Vai ser uma noite turbulenta!”, em “A Malvada”. |
63 — “Essa aranha é do tamanho de um carro!” Woody Allen em “Noivo Neurótico, Noiva Nervosa”. |
64 — A corrida de bigas em “Ben-Hur”. |
65 — Barbara Harris cantando “It Don’t Worry Me” para acalmar a multidão em pânico em “Nashville”, de Robert Altman. |
66 — A disputa de roleta-russa em “O Franco-Atirador”. |
67 — Cenas de perseguição: “Operação França”, “Bullit”, “Os Caçadores da Arca Perdida”, “Diva — Paixão Perigosa”. |
68 — A sombra da garrafa escondida na luminária, em “Farrapo Humano”. |
69 — “Eu poderia ser um lutador [de boxe]”. Marlon Brando em “Sindicato de Ladrões”. |
70 — O discurso de George C. Scott sobre o inimigo em “Patton —
Rebelde ou Herói?”: “Vamos passar por ele como faca quente na manteiga”. |
71 — Rocky Balboa correndo escadaria acima e agitando os punhos no alto, com Filadélfia a seus pés [em “Rocky — Um Lutador”]. |
72 — Debra Winger se despedindo dos filhos em “Laços de Ternura”. |
73 — A montagem das cenas de beijo em “Cinema Paradiso”. |
74 — Os convidados do jantar que acham que de alguma forma não podem ir embora, em “O Anjo Exterminador”, de Luis Buñuel. |
75 — O cavaleiro jogando xadrez com a morte, em “O Sétimo Selo”, de Ingmar Bergman. |
76 — O zelo selvagem dos membros da Ku Klux Klan em “O Nascimento de uma Nação”, de D. W. Griffith. |
77 — O problema da porta que não para fechada, em “As Férias do Sr. Hulot”, de Jacques Tati. |
78 — “Eu sou grande. Os filmes é que ficaram pequenos.” Gloria Swanson em “Crepúsculo dos Deuses”. |
79 — “Agora eu sei que não estamos no Kansas.” Judy Garland em “O Mágico de Oz”. |
80 — O plano que começa no alto do saguão e termina em close-up da
chave na mão de Ingrid Bergman, em “Interlúdio”, de Alfred Hitchcock. |
81 — “Não tem muita carne nela, mas a que tem é de primeira.” Spencer Tracy sobre Katharine Hepburn em “A Mulher Absoluta”. |
82 — A excursão dos doentes mentais em “Um Estranho no Ninho”. |
83 — “Sempre pareço bem quando estou à beira da morte.” Greta Garbo a Elizabeth Allan em “A Dama das Camélias”. |
84 — “Levou mais de uma noite para mudar meu nome para Shanghai Lily.” Marlene Dietrich em “O Expresso de Shangai”. |
85 — “Estou andando aqui!” Dustin Hoffman em “Perdidos na Noite”. |
86 — W. C. Fields atirando punhados de neve cenográfica no próprio rosto, em “O Último Drink”. |
87 — “Da próxima vez que você não tiver nada pra fazer, e muito tempo disponível, venha me ver.” Mae West em “Minha Dengosa”. |
88 — “Consegui, mamãe. O topo do mundo!” James Cagney em “Fúria Sanguinária”. |
89 — Richard Burton explodindo quando Elizabeth Taylor revela o “segredo” deles, em “Quem Tem Medo de Virginia Woolf?” |
90 — Henry Fonda de cabelo cortado em “Paixão de Fortes”. |
91 — “Distintivos? Não temos distintivos. Não precisamos de
distintivos. Não tenho que te mostrar droga de distintivo nenhum.”
Alfonso Bedoya para Humphrey Bogart em “O Tesouro de Sierra Madre”. |
92 — “Aí está o seu cachorro. Ele está morto. Mas tinha de haver
algo que o fazia mover-se [quando vivo]. Não tinha.” Do documentário
“Portais do Céu”, de Errol Morris. |
93 — Não toque no terno!” Burt Lancaster em “Atlantic City”. |
94 — Gena Rowlands chega à casa de John Cassavetes num táxi cheio de animais adotados, em “Amantes”. |
95 — “Quero viver novamente. Quero viver novamente. Quero viver
novamente. Por favor, Deus, deixe-me viver novamente.” James Stewart
para o anjo em “A Felicidade Não se Compra”. |
96 — Burt Lancaster e Deborah Kerr abraçados na praia, em “A Um Passo da Eternidade”. |
97 — Mookie jogando a lata de lixo pela janela da pizzaria de Salvatore, em “Faça a Coisa Certa”. |
98 — “Adoro o cheiro de napalm pela manhã.” Robert Duvall em “Apocalypse Now”. | | |
| 99 — “A natureza, Sr. Allnut, é algo em que fomos postos neste mundo
para superar.” Katharine Hepburn para Humphrey Bogart em “Uma Aventura
na África”. |
100 — “Mãe de misericórdia. Este é o fim de Rico?” Edward G. Robinson em “Alma no Lodo”.
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