O filme que o Brasil não conhece


Urariano Mota, Direto da Redação

A melhor diferença da imprensa na web sobre a do grande capital é, sem dúvida, a liberdade de pensamento.  Mas há um valor a mais de um texto na internet sobre o de papel: é a  sua permanência, com acessos infinitos no tempo  e espaço para a leitura. Assim foi com a coluna  “Procura-se um documentário sobre o Brasil”, publicada em agosto do ano passado. Ela me fez receber nos últimos dias um presente que eu não imaginava.

Tudo começou com uma mensagem irritada, reenviada pelo robô do Direto da Redação: “Não consigo comunicar-me através do seu email, sempre é rejeitado. Mande seu email correto.  Fernando”. Confesso que até o último minuto pensei em não responder. São tantos os insultos tomados em razão do que escrevemos, de promessas de surras a coisas mais graves, que pensei, se foi rejeitado é porque o spam detectou  vírus ou armadilha. E não estou aqui para receber intimações... Mas antes de jogar na lixeira, um espírito santo  - pois os ateus também possuem um, aquele que nos prende ao respeito que merecem todas as pessoas – me segurou o gesto. E respondi, meio ferido: “o email é este em que lhe respondo”.

 O protetor dos ateus existe. Não recebi bem o documentário de 1961, que o Brasil até hoje desconhece. Mas recebi algo tão bom quanto, pois me chegaram fotos históricas do filme, e a descoberta de um fotógrafo de 76 anos, que os estudiosos do  cinema não sabiam existir. Eu me refiro ao espanhol Fernando Martinez Lopez, que me enviou tantas fotos maravilhosas em preto e branco desse documentário “Brazil, the troubled land”. Fernando Martinez, a partir das perguntas feitas por este curioso, assim se apresentou:

Após busca  entre 4000 negativos, encontrei as fotos, algumas estragadas pelo tempo. Sou espanhol, casado com brasileira e filhos e netos brasileiros. Trabalhei no filme como Still fotógrafo e também como cinematographer.

Still significa aquele que se encarrega das fotografias comuns de um filme  para apresentar o filme como nas carteleras e revistas, jornais etc. Cinematographer é aquele encarregado da fotografia na filmagem, luz,  etc,, no caso de um documentário. O maior valor desta fotografia cabe exclusivamente a quem a executa e faz a tomada de planos. Por conta dele, principalmente no meu caso, eu  tive a incumbência de fazer as duas coisas, calcular luz ambiente tomadas travelling (a câmera se desloca para a direita ou esquerda para cima ou para baixo, tudo fica por sua conta, não pode errar em nada, pois é um acontecimento na hora). Naquele tempo as câmeras não tinham automatismo como hoje em dia, por isso se tornava mais difícil calcular distância, luz e movimentos. Era um Deus nos acuda. Eu fiquei com esta parte principalmente, e Hartigan com a câmera de gravação de som ao vivo, mais entrevistas.

Helen (Helen Rogers, a diretora do documentário) era uma americana bonita e muito inteligente, casada com um cineasta, eles deixaram dois filhos. Para mim, ela era pró-Estados Unidos, pois este filme foi feito justamente para que o Brasil não se tornasse uma nova Cuba. (Negrito do colunista) Foi filmado na Zona da Mata de Pernambuco, para filmar a vida de um camponês. Na feira de Carpina encontrou um Severino, cortador de cana, que trabalhava para Constâncio Maranhão. A filmagem demorou aproximadamente 25 dias, tendo a contribuição da Sudene para transporte etc.”

Então olhem só a raridade que selecionei para ilustração do texto: Helen Rogers, Francisco Julião, Eva (tradutora) e Bill Hartigan. Mais atrás, o jornalista Alexandrino Rocha. Tão sorridentes os gringos... Esse flagrante da política traiçoeira dos Estados Unidos, que enviou uma bem intencionada cineasta ao Nordeste do Brasil, para que documentasse uma nova Cuba em território pernambucano, nem precisa de legenda.

Alexandrino Rocha, que aparece ao fundo da imagem,  era na época secretário de imprensa do governador Miguel Arraes. Hoje com 82 anos, ele me disse por telefone:

Eu nunca vi fuzil na mão de qualquer camponês. Isso foi tudo criado. Os Estados Unidos foram os responsáveis por essa mentira. No governo Kennedy, caíram os governos democratas da América Latina, e ele com a cara de galã, de bom moço. Os repórteres do New York Times que chegavam ao Recife já vinham falando bem o português”.  

Em resumo: não teria sido possível a recuperação das imagens do documentário sem a internet. Isso é para curar um descrente, que pesquisava imagens para o cenário  do seu próximo romance, “O filho renegado de Deus”.  

2 comentários:

Anônimo disse...

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Urariano Huehuahuehuahehehuahuehuahueh!!