Scorpions, ou o estilo de uma banda ao pendurar as chuteiras

O guitarrista Rudolf Schenker (à esq.) com o resto da banda – Reprodução Facebook
Jotabê Medeiros, Farofafá

A mãe de Rudolf Schenker, guitarrista e fundador do Scorpions, queria que ele se tornasse eletricista na Siemens ou seguisse uma carreira nos Correios de Hanover, na Alemanha. Dona Schenker era dura na queda: obrigou o músico a se formar técnico em eletricidade, mas há 50 anos ele acabou criando aquela que se tornaria a primeira banda de hard rock da Alemanha, o Scorpions.

Suas baladas kitsch, de exagero sentimental, ganharam o mundo e tornaram o Scorpions um dos maiores sucessos planetários da música. Influenciaram bandas posteriores, como Mötley Crüe e Guns N’ Roses. “Há pouco tempo, encontrei um antigo livro-caixa da minha mãe no qual, 50 anos atrás, ela meticulosamente registrava as receitas e as despesas da minha banda, o Scorpions. Meus mais me emprestaram, na época, o dinheiro para comprar meu primeiro equipamento e eu tinha que devolver em prestações conforme ganhasse dinheiro”, contou o músico.

O Scorpions está pelo mundo dizendo adeus. De novo, como Silvio Caldas – há três anos, com o disco “Sting in the Tail”, já tinham falado que era a última. Fizeram um filme no qual se despedem da vida no rock. Com uma promessa de desembarcar no Brasil com a turnê na qual celebram 50 anos e a eternidade, Schenker falou comigo brevemente, há pouco mais de um mês, por telefone.

Acabam de lançar um disco batizado como “Return to Forever” (Sony/BMG), e têm uma legião de fãs por aqui desde que desembarcaram para o primeiro Rock in Rio, há 30 anos. Além de Schenker, um mito do rock, o Scorpions tem Klaus Meine (voz da banda desde 1969), Matthias Jabbs (guitarra e voz), James Kottak (bateria, único norte-americano) e Pavel Maciwoda (baixo, polonês). A seguir, um pouco da conversa com Schenker.

Você sabe, esse nome, “Return to Forever”, é o nome de um disco e uma formação de jazz fusion do Chick Corea. Na verdade, um dos mais famosos discos do jazz.

Eu na verdade não tinha um título. Sabe aquelas coisas de gravadora? Alguém lá no fundo disse “encontramos uma boa ideia para o nome do álbum!”, e achamos legal. Eu nunca soube que existia uma banda de jazz com esse nome.

Em fevereiro, quando nós nos reunimos para concluir o disco, nós estávamos com muita energia e foi saindo muito rapidamente. Gravamos as faixas no estúdio da minha casa. Era um clima “temos que fazer esse disco”, precisamos de uma coisa nova para celebrar os 50 anos, e começamos a compor. Logo tínhamos 9 canções (ao todo, são 19 músicas, 12 no disco e todas na edição especial). Essa história começa em 1965, e acho que só os Rolling Stones e o The Who estão há tanto tempo na estrada. Atravessamos a era punk, o grunge, a disco music. Tínhamos de achar um jeito de festejar.

 Mas essa turnê do cinquentenário não surgiu de um dia para o outro, certo?

Há 5 anos, nós começamos a pensar nisso. Chegamos a anunciar que estávamos parando e pensamos em correr 90 países em três anos. A essência do que nós somos é a estrada, é a turnê. Mas havia um certo cansaço com a rotina de estúdios, discos, turnês e a gente pensou ali em parar definitivamente. Mas não permitiram. Nos aeroportos, os fãs nos traziam flores e diziam: “Vocês não podem parar, não é justo!”. Os colegas músicos pediam para a gente continuar. Isso tocou o coração da gente. Em todo lugar, era aquela coisa, todo mundo pedindo para a gente seguir. Foi assim durante anos. E nós seguimos em frente. Foi então que surgiu a ideia dessa turnê final e do filme.

E como foi feito o documentário “Forever and a Day – The Scorpions Film”?

Há quase uma década, nós começamos a registrar nossos últimos momentos juntos. Era para ser uma espécie de testamento. Mas essa coisa de filmar intimidade é muito delicada, não dava para ser qualquer pessoa filmando. Foi quando nós resolvemos procurar uma mulher, Katja Von Garnier. Nós a escolhemos também porque ela tinha uma banda feminina, e ela achou um jeito de falar de nossa história com sensibilidade. Fez algo diferente, algo inacreditável. “Você pode filmar tudo”, eu disse pra ela. E ela coletou entrevistas tocantes, shows maravilhosos pelo mundo. Entrou em todos os lugares, em quartos de hotel, camarins, esteve em Paris com a gente. Não é um filme sobre os clichês do rock and roll, mas é a documentação de uma turnê iluminada.

Há 30 anos, quando vocês desembarcaram no Rio de Janeiro para o primeiro Rock in Rio, já tinham 20 anos de estrada. O que você lembra daqueles dias?

Foi maravilhoso. Ficamos 7 dias no Rio. Tínhamos lá também alguns amigos, o pessoal do Queen, James Taylor. Foi como uma realização para a gente, porque nós sempre quisemos ir, e acabamos indo duas vezes ao festival. Eu considero aquele o período mais louco da minha vida. As pessoas aplaudiam tudo, eram generosas e participativas. E ainda tivemos tempo para sair na noite. Os guarda-costas nos alertavam: “O Rio é perigoso, não é bom ficar dando mole por aí!” Mas nós saíamos todas as noites, todas as bandas saíam, nada aconteceu e vivemos aventuras maravilhosas.

Publicado originalmente em El Pájaro que Come Piedra

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