Joey (Richie Andrusco), retrato da inocência possível |
Orlando Margarido,CartaCapital
Cabe toda uma América no olhar de Joey, o garoto de 7 anos protagonista de O Pequeno Fugitivo,
joia do cinema independente americano de 1953. Não apenas pela
alternância entre o exultante e a tristeza, mas no que seus olhos
mostram das situações entre um Brooklyn nova-iorquino ainda calmo e
suburbano e a eufórica praia de Coney Island, onde viverá experiências
idílicas a alguém de sua idade. Naquele um dia e meio em que o caçula
perambula solitário depois de fugir por crer ter matado o irmão, há a
diversão no carrossel, a pose de caubói para o fotógrafo, os repetidos
passeios de pônei e a cata de vasilhames de refrigerante que lhe
garantem os trocados para a farra.
É um painel da infância e inocência ainda
possível num momento próprio do pós-Guerra, embalado pela retomada do
progresso. Mas principalmente da certeza sensível do trio de diretores
Ray Ashley, Morris Engel e Ruth Orkin, estes dois um casal de fotógrafos
que experimentava o cinema, em capturar um período incomum.
Também inovadora foi a concepção do filme que influenciou a nouvelle vague francesa, inspirou François Truffaut a Os Incompreendidos
e conquistou John Cassavettes e Martin Scorsese. Engel, então um
renomado fotógrafo da vida americana, desenhou com Charlie Woodruff,
inventor e parceiro no front, uma pequena câmera de mão de 35
milímetros que lhe garantiu a mobilidade para acompanhar as travessuras
de Joey e ao mesmo tempo registrar os inúmeros figurantes involuntários
sem ser notado.
A engenhoca se tornaria um modelo para a futura steadicam.
Tão refinado surge o preto e branco de forte contraste que na escola
fotográfica americana lembra o trabalho de colegas como Walker Evans e
Dorothea Lange. Acima de tudo, o diretor de obra única deve ao achado de
Richie Andrusco, o cativante ator não profissional de olhar inocente, o
triunfo do filme, tanto quanto Antoine Doinel foi para Truffaut."
Confira o trailer abaixo:
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